Aparato do Entretenimento: Monólogo adaptado de obra francesa, "De Volta a Reims" discute a ruptura entre classes e a subjetividade gay; confira
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Monólogo adaptado de obra francesa, "De Volta a Reims" discute a ruptura entre classes e a subjetividade gay; confira

Na foto, o escritor Didier Eribon - Créditos: Divulgação

Ainda inédito no Brasil e com publicação prevista para 2020, o relato autobiográfico Retour à Reims, escrito pelo filósofo francês Didier Eribon em 2009, ganha montagem teatral livremente inspirada na obra que estreia dia 13 de abril, sábado, 21h no Viga Espaço Cênico. A peça tem direção de Cácia Goulart com assistência de Emerson Rossini, texto de Reni Adriano e tem interpretação de Pedro Vieira, indicado ao prêmio Shell de Melho Ator em 2016 com o espetáculo Eu Tenho Tudo, também dirigido por Cácia Goulart.
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O desejo de montar De Volta a Reims partiu do ator Pedro Vieira, que assistiu uma adaptação da obra de Eribon no Festival de Avignon em 2017. O enredo acompanha o retorno de um intelectual à sua terra natal, onde se depara com um cenário político e social completamente diferente do da época em que morava lá, mais de 30 anos atrás. Entre os questionamentos que o acometem, estão sua relação com a própria sexualidade, alvo de ataques homofóbicos no tempo em que vivia no local, e o contexto operário que mudou completamente de perfil nas últimas décadas. Para Cácia Goulart, diretora da montagem, a interpretação de Pedro trafega pelo drama e pela filosofia, o que conecta suas memórias e realidade histórica às narrativas de Eribon.

“Além de atual o tema é universal e, quando escrito, já antecipava a ascensão da ultradireita e do neoliberalismo no mundo. Tivemos vivências diferentes mas, todos nós, em algum momento da vida, de algum modo tivemos experiências ligadas à homofobia, questões ligadas a raça e posição social. Tudo isso nos move a mergulhar nesse trabalho”, conta Emerson Rossini, assistente de direção e produtor de De Volta a Reims. Cácia Goulart complementa: “Proponho uma encenação que valorize sobretudo a dramaturgia construída a partir do que é essencial na obra original: a força absoluta do texto como um tecido de ideias necessárias ao nosso tempo”. Tais questões foram trazidas à cena por meio do texto, som e imagens que acompanham as memórias do personagem.
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“Alarmado com a ascensão galopante da extrema direita na Europa e a aceitação crescente dos discursos e práticas xenófobos junto às classes trabalhadoras, o autor faz ainda uma ferrenha crítica à esquerda, por esta não ter mais um projeto de mundo e, nas últimas décadas, ter feito coro aos discursos neoliberais”, pontua o dramaturgo Reni Adriano, complementando que também é possível observar no Brasil um movimento de esquerda desarticulado, que possibilitou o crescimento de práticas políticas autoritárias e desalinhadas aos interesses do povo.

O livro Retour à Reims será publicado no Brasil em breve e já foi traduzido três vezes para o inglês – nos Estados Unidos, Inglaterra e Canadá – e uma na Alemanha. Didier Eribon é mais conhecido mundialmente por ser autor da biografia de Michel Foucault, mas seu livro de memórias lançado em 2009 tem recebido acolhida calorosa em todo o mundo, tendo sido adaptado para o teatro em três países: França (Laurent Hatat, 2014), Alemanha (Thomas Ostermeier, 2017) e Bélgica (Stéphane Arcas, 2017).

“É um relato sobre a luta para se libertar de um meio social operário homofóbico e a impossibilidade de reconciliar-se com as classes populares representadas pelos próprios pais e irmãos, trinta anos depois. A constituição da identidade sexual do autor aparece como um profundo projeto político de libertação e questionamento do poder, ao mesmo tempo em que a sexualidade torna possível o ‘milagre’ de sua ascensão social e intelectual, elevando-o a uma classe média cultural que o distancia para sempre dos afetos familiares”, sintetiza o dramaturgo Reni Adriano, complementando que o texto acompanha a volta do personagem à sua cidade de origem após a morte do seu pai, o que desencadeia muitas dessas reflexões.

“Essa fusão de realidades universaliza o sentimento de resistência à força conservadora que cresce em muitas partes do mundo, e de forma assustadora no Brasil, onde a situação nos parece ainda mais grave, porque somos uma frágil e jovem democracia assolada por um golpe político cujo resultado, entre outras catástrofes sociais e econômicas, é o sufocamento crescente de uma cultura miscigenada e vibrante”, diz Cácia Goulart.

O assistente de direção Emerson Rossini, que já trabalha em parceria com Pedro há mais de vinte anos, conta que a diretora optou por uma encenação simples, necessária para que se evidencie o texto interpretado por Pedro e sua correlação com as projeções que o acompanham. “Pedro nasceu em Palmeiras dos Índios, em Alagoas, e veio para São Paulo aos 17 anos. Sua história também tem relações fortes com o relato de Eribon e de Reni”, conta Emerson.
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Cácia Goulart reforça que o mergulho do ator nas próprias memórias e nas questões propostas por Eribon é urgente para um processo de reparação histórica à nossa trajetória de país colonizado, sempre sujeito a todo tipo de violência. “A partir de um minucioso trabalho em sala de ensaio, o ator evoca suas próprias afecções em contato com a contundência crítica de Eribon, jogando com as suas memórias, iconografias, cantigas e outras expressões culturais locais para criar um espaço de desnudamento, de ‘cara lavada’, posta diante de outros seres humanos”, finaliza.

SERVIÇO
De Volta a Reims
De 13 de abril a 26 de maio de 2019
Sextas e sábados, às 21h, e domingo, às 19h
Local: Viga Espaço Cênico (Rua Capote Valente, 1323 CEP: 05409-003). Entre a rua Heitor Penteado e a Amália de Noronha, próximo ao metrô Sumaré. Tel: (11) 3801-1843.  


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